segunda-feira, 22 de junho de 2009

O aluno no centro do aprendizado


(Matéria originalmente publicada por Cedê Silva no site do Ceale, Faculdade de Educação, UFMG)

AS CARTEIRAS DA SALA DE AULA estão dispostas em círculo. Os alunos, trajando terno e gravata, falam um jargão próprio: “questões”, “moções”, “sanções”, “comitês”. Não se trata de um debate qualquer: o professor nem sempre está em sala. Na verdade, os alunos sequer defendem a própria opinião. Com entusiasmo, sustentam os pontos de vista de potências estrangeiras, teocracias islâmicas, ditaduras comunistas e até de países que não existem mais. Quem organiza os encontros é um aluno que, empunhando um martelo, concede a palavra aos debatedores, chamados de “delegados”.


Esse é o cenário no CM Mundi, simulação política realizada semestralmente, desde 2006, no Colégio Militar de Belo Horizonte (CMBH). Segundo o professor Capitão Edmundo Alencar, o CM Mundi surgiu por iniciativa dos alunos: “eles tiveram experiência em simulações fora do colégio e nós acabamos comprando essa ideia, vendo o potencial que ela tem no aspecto educativo”.


Na Escola Estadual de Ensino Médio Baltazar Oliveira Garcia, em Porto Alegre (RS), foram estudantes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) que levaram a prática para o colégio. Em maio de 2008, catorze alunos do terceiro ano assumiram o papel de diplomatas e participaram de uma discussão, acompanhada pelo professor Jonas Oliveira, sobre aquecimento global e mudanças climáticas. “Decidimos que a simulação seria feita para o 3º ano porque eles demonstraram um alto interesse na atividade. Uma das estudantes da UFRGS chegou a comentar, inclusive, que nunca tinha visto um grupo tão politizado. Acabei aprendendo, com meus alunos, muitas coisas sobre política”, conta o professor, orgulhoso.


Como Funciona

As Simulações das Nações Unidas, também conhecidas como modelos ou simplesmente simulações, são uma ferramenta didática antiga. Precedem a própria ONU (na década de 1920, alunos de Harvard já simulavam a Liga das Nações, hoje extinta). No Brasil, só chegaram em 1998, com a criação do Americas Model United Nations (Modelo das Nações Unidas das Américas), da Universidade de Brasília. Voltado para universitários, o projeto é realizado em julho na capital federal e, neste ano, completa sua 12ª edição.

A prática das simulações é semelhante aos debates em sala de aula: as carteiras ficam dispostas em círculo e são os alunos que falam por todo – ou quase todo – o tempo. Mas há três diferenças cruciais: a primeira está no fato de que os estudantes não dizem necessariamente o que pensam, mas debatem os pontos de vista dos governos que representam. Para isso, cada um interpreta o papel de diplomata de um determinado país.


A segunda diferença é que eles não discutem apenas para trocar ideias. Em quase todos os casos, há o texto de uma resolução em jogo. É como se fosse uma redação em grupo, com vários interesses envolvidos. Os alunos devem não apenas debater tecnicamente o assunto, mas formar alianças, somar votos e neutralizar os argumentos adversários. E a terceira diferença é que os estudantes sempre simulam um órgão específico (o comitê), com suas próprias regras, funções e poderes.


Vantagens

Para o professor Edmundo Alencar, as vantagens das simulações em relação a uma aula expositiva comum são muitas. “Simulações motivam, fazem o aluno pesquisar. Ele procura aprender antes de simular, e durante a simulação também há um incentivo grande ao aprendizado porque ele volta no outro dia para a escola com novos conhecimentos.” O professor acredita, ainda, que esta prática estimula o aluno a estudar por conta própria e a “andar com as próprias pernas”.


Jonas Oliveira complementa: “essa aprendizagem contextualizada tem outro valor porque o aluno teve de estudar história, política, geografia, dados matemáticos e físicos para compor sua argumentação”.


A prática das simulações parece alcançar um antigo objetivo: colocar os alunos no centro do aprendizado. “Cabe aos professores complementar, em termos de informação, dar suporte e ajudá-los a tirar dúvidas”, diz Edmundo Alencar. No caso do CMBH, o professor acrescenta que os docentes apoiam, também, organizando a estrutura física, possibilitando o acesso a salas de aula e fornecendo o suporte, a segurança e os materiais necessários para que o evento aconteça.


Como Fazer

Criar uma simulação requer passos simples e há farto material gratuito disponível na internet que pode contribuir com o trabalho. Basicamente, o organizador deve decidir três elementos: o assunto, o comitê, e os países que vão participar da discussão. Uma vez decididos o comitê e o assunto, o organizador informa aos interessados a lista de países disponíveis, que podem ser distribuídos entre os alunos das mais variadas formas. Na última simulação do Colégio Militar, por exemplo, realizada em março de 2009, essa lista de atores internacionais era definida pelo próprio assunto – os países que realmente participaram do Congresso de Viena (1815). Já na E.E. Baltazar Oliveira Garcia foram os alunos que escolheram seus países, de acordo com seus interesses culturais e familiares.


A estudante Maria Luísa Pereira, do 3º ano do Colégio Militar, foi organizadora dessa sétima edição do CM Mundi, em março. Ela estreou nos modelos em 2007, na segunda edição do evento. De delegada, passou a chefe da delegação de seu colégio na SiNUS (Simulação das Nações Unidas para Secundaristas), da UnB; e, em seguida, tornou-se diretora do CM Mundi. “Eu simplesmente me apaixonei por simulação. Pela forma como as reuniões são conduzidas, como você é obrigado a se portar. É uma sensação indescritível estar no meio de uma sala, participando de ‘reuniões internacionais’, tentando defender um ponto de vista. É incrivelmente envolvente,” diz.


Para quem não pode organizar uma simulação no próprio colégio ou quer conhecer melhor a prática antes de adotá-la, existem as simulações intercolegiais, promovidas por universidades e frequentadas por dezenas de escolas diferentes - muitas vezes num contexto competitivo.


Nas Escolas

Quase todas as simulações da ONU no Brasil são organizadas por estudantes universitários, a grande maioria vindo dos cursos de direito e de relações internacionais. O fato de serem promovidas por graduandos, contudo, não implica que sejam eles o único público. O maior evento do tipo no país, que reúne cerca de mil “delegados” do ensino médio, todos os anos, é o MINI-ONU (Modelo Intercolegial da ONU), promovido pela PUC-Minas. Criado em 2000, o evento é o mais antigo modelo voltado para o ensino médio no Brasil e, em outubro, completa sua décima edição. Dezenas de eventos do tipo são realizados a cada ano no Brasil, quase todos em capitais.


Todos os modelos listados abaixo aceitam estudantes de ensino médio de todo o Brasil. As inscrições são feitas pela internet e é cobrada uma taxa por delegado. Alguns modelos isentam desse pagamento os alunos de escolas públicas e há um, em São Paulo (o Global Classrooms), exclusivo para escolas públicas. Geralmente, um professor responsável pode ser inscrito de graça – em alguns casos, esta presença é obrigatória. A maior parte das simulações é conduzida inteiramente em português. Porém, alguns modelos oferecem “comitês” (organizações simuladas) em inglês ou espanhol.

Distrito Federal
8ª SiNUS -
www.sinus.org.br

Minas Gerais
10º MINI-ONU -
www.pucminas.br/mini-onu

Rio de Janeiro
6º MIRIN - www.mirin-puc.com
7º ONU JR. -
www.onujr.com

São Paulo
5º Fórum FAAP - www.faap.br/forum_2009
Global Classroomswww.gcsp.org.br (Exclusivo para a rede pública de São Paulo)
4º PoliONU -
www.sistemapoliedro.com.br/polionu/polionu.html
4ª SiEM -
www.siem.org.br

Autor: Cedê Silva

3 comentários:

  1. muuuuito bom!

    Muita gente, mesmo dentro dos modelos, não tem noção do tamanho do valor pedagógico que uma simulação pode ter.
    Como um futuro educador em potencial, não poderia deixar de falar que todos os dias, nas minhas aulas de Fundamentos de Aprendizagem e de Didática, eu me deparo com assuntos onde as simulações são exemplos mais que perfeitos de teorias pedagógicas aplicadas, aliás já foram até tema de trabalho final meu (não tinha como deixar de ser).

    Atuar dentro das escolas é o que estamos querendo fazer na SiNUS a partir da próxima edição. torçam para que dê certo!

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  2. DICA: eu apareço na foto. Onde estou Wally?

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