
Mais um episódio da saga "modelando pelo mundo".
Eis que seis brasileiros doidivanas resolveram simular a ONU no Oriente. Sim, Oriente, pois o
Istanbul International Model United Nations acontecia na metade asiática da Cidade de Constantino. E, de qualquer modo, essa história de Turquia "laica-portanto-ocidental" é conto da carochinha.
Modelo pequeno mas aconchegante, com cheiro de comida da vovó. Duzentos delegados instalados em cinco comitês tradicionais. Esta foi a primeira edição do IIMUN, mas a Modelândia turca já possui uns sete anos de idade, quase empatando com a nossa. A proporção de delegados estrangeiros era extraordinariamente alta para um MUN no seu primeiro ano: uns 60% de forasteiros, naturais de vinte diferentes países, da Holanda a Cingapura.
Agora pasmem, amigos modeleiros: todos os organizadores do IIMUN, sem exceção, estavam no administrativo. Simplesmente
não havia equipe acadêmica até sete semanas antes do modelo, quando os diretores e assistentes foram selecionados por application online. Eu fui recrutado pra presidir o Conselho Europeu.

Este método tem um lado bom:
o corpo de diretores era rico e variado, muito melhor do que os adolescentes espinhudos e levemente bêbados que moderam os comitês do Harvard WorldMUN. Em compensação, a liberdade acadêmica dos diretores estrangeiros é quase nula. Eu fiquei meio irritado por ter que escrever um guia de estudos sem ao menos poder escolher os tópicos de meu comitê; eles foram definidos antecipadamente pelo secretariado.
Meu comitê funcionou bem e estável, sem maiores sobressaltos. Em compensação, o nível foi fraco no DISEC - onde estavam a gauchissima Lena Jornada e o paulista Heitor Miranda - e especialmente no UNSC, onde nosso delegado era o garoto-prodígio
Guilherme Pastore. Resoluções ilógicas e
ultra vires, diretores que interrompem delegados para falar bobagem na hora errada, usw.
O que realmente estragou os comitês do Istanbul MUN foi a infeliz parceria do secretariado com uma certa Comunidade de Modelistas Independentes. Este nome pomposo designa um clube de modeleiros turcos que reproduzem pateticamente uma hierarquia militar, consideram-se "chanceleres" e "conselheiros" e desfilam orgulhosamente com medalhinhas de papel que representam a experiência ganha em MUNs. Em uma frase, eles são o equivalente modeleiro dos
trekkers: gente que leva um hobby a sério demais, caindo no ridículo. Estes neonerds do Oriente Médio foram designados para coordenar todo o setor acadêmico da simulação. Foram os responsáveis pelo fracasso do UNSC e do DISEC, citados acima. Apelidamos o chefe do grupo, homem deveras espaçoso, de "Nhonho Otomano". Ele lembrava vagamente a Babá Egípcia.
Mas a organização, ah, meus amigos! Essa foi digna dos caprichos do Sultão. Festas no Bósforo. Piscina para os delegados. A balada do Michael Schumacher. Transporte eficiente para as massas modeleiras. Alojamento confortável e barato para todo mundo no campus da universidade, onde ocorria a simulação. Apenas uma falha séria: em pleno verão turco, ninguém providenciou ventiladores, muito menos ar-condicionado.

Enfim, o turista-correspondente-modeleiro que vos escreve trouxe uma certeza da Turquia, confirmando impressões adquiridas em outros MUNs internacionais. Os modelos brasileiros estão na vanguarda mundial em termos acadêmicos, embora ainda possam evoluir um pouco rumo ao profissionalismo administrativo das simulações do Hemisfério Norte. A Modelândia nacional já está maduríssima, quase passando do ponto. Agora precisamos globalizá-la. O mundo tem muito a aprender conosco.
Modelos da ONU. Entre todas as artes, será justamente essa a nossa especialidade? O Brasil é mesmo uma pátria de atores.