segunda-feira, 9 de abril de 2007

O dilema da História

Todos os integrantes deste blog, em determinado(s) momento(s) de suas carreiras em modelos e simulações, participaram de uma simulação histórica. Seja o Conselho de Segurança da ONU, o Congresso de Westphalia, a Conferência de Bandung ou qualquer outro organismo intergovernamental ou não, simulações históricas são bastante recorrentes, sendo um crowd favorite aqui no Brasil (tanto que há dois modelos grandes centrados nisso).

Toda simulação histórica, no entanto, padece de um grande dilema. Naturalmente, a idéia de uma simulação pressupõe que, ainda que com as devidas licenças poéticas necessárias para se conduzir uma simulação, as coisas devem correr da forma mais realista possível. Por realismo incluem-se no pacote a criação de todo um ambiente político externo ao organismo sendo simulado, a representação de personalidades, políticas e cargos, cada qual com seus interesses e traços de personalidade. A palavra-chave nessas horas é ambientação.

Durante a simulação nós estaremos recriando a história. Como o futuro não está definido ainda, as decisões que tomarmos são o que definirão o que acontecerá nos próximos dias. As decisões tomadas têm conseqüências (algo ainda mais evidente em simulações estilo gabinete). Mas é possível mudar a história?

Por um lado, a revisão da história, tomando um rumo diferente do que de fato aconteceu, dá uma sensação similar à de superioridade. "Eu fiz melhor que o Fulano, e não matei um monte de gente pra ter o que eu queria." Também dá mais objetivo à simulação, já que os delegados ficam um pouco mais animados com a possibilidade de mudar algo que não deu certo.

Mas por outro lado, isso só ocorre com um sacrifício do realismo. Afinal, o realismo da simulação também inclui todos os constraints que os personagens da reunião tinham quando fizeram suas decisões. É a decisão com peso na consciência, e isso acontece sempre - "quero fazer X, mas as circunstâncias só me permitem Y".

O que é mais proveitoso para os delegados? Reviver a história ou refazer a história? Pessoalmente, sou partidário da primeira opção. É uma opção mais segura, e é o que realmente dá qualidade acadêmica à simulação. Mas em termos de diversão pura, talvez a segunda seja seja mais proveitosa.

Mas isso é uma questão que depende de modeleiro pra modeleiro.

5 comentários:

  1. Essa é uma questão fundamental nos comitês históricos. Afinal, ou você escolhe o Velho ou o Novo. Ou o velho resultado (a simulação nesses moldes deve acontecer exatamente como foi na vida real, e qualquer desvio é um erro de simulação) ou o Novo, que é julgar que a situação teria sido diferente com outras pessoas, outras idéias.

    De certa forma, é como se no primeiro caso fosse garantido o final, o resultado, e no segundo, o começo, a ambientação inicial. Tendo o X ou Y fixo, o outro passa a ser uma variável.

    Me pergunto se algum dia poderíamos ter uma espécie de aviso claro: "Simulação Tipo A", quase como uma caixa de leite. Simulação de Resultado e Simulação de Atores, talvez...

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  2. Em simulações em que não há a representação de personagens, apenas de cargos (exemplo: Conselho de Ministros de 1868/TEMAS 2006), a margem criativa, por assim dizer, é maior. Nós podemos fazer as coisas "do nosso jeito" tendo em mente os constraints que todo modelo histórico (contexto, respostas, limitações etc.).

    Mas em uma simulação que inclui as personalidades também (ex: CSN-1968/SiEM 2006, USNSC-1970/TEMAS 2007), isso fica bem mais restrito.

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  3. Uma das soluções é justamente fazer essa distinção: vocês não são as pessoas, vocês são vocês. Mas isso ignora o background do personagem e libera a position do delegado a qualquer coisa que der em sua telha. E depois aguente as consequências.

    Não estou advogando por uma postura nem outra, só ressaltando a complexidade das simulações históricas.

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  4. Bom, eu sou partidário do seguinte (falei isso muitas vezes, inclusive no balanço final do 1970.NSC): o que o comitê histórico tem que fazer é reproduzir os limites que os atores estavam envolvidos na época. Se tem a opinião pública xingando todo movimento dos delegados, vc tem que fazer com que a opinião pública xingue os delegados e pronto. Acho que se você não tem os limites colocados pela situação histórica não faz sentido ter uma simulação histórica.

    Não obstante, vejo que mesmo dentro dos limites colocados pela realidade da situação simulada, ainda há margem de manobra pra imaginação e criação de elementos.

    Sobre personalidades e cargos, sou a favor de manter elementos das personalidades, principalmente pq muitos elementos da personalidade constroem a posição do cargo. Afinal, se o Nixon não fosse o Nixon, muita coisa seria diferente...

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  5. (vou falar de comitês internacionais, e não de gabinetes)

    Acho que recriar mecanicamente o passado não faz muito sentido. Se a idéia fosse apenas repetir a vida real, seria melhor ficar em casa e ler um bom livro a respeito da conferência simulada.

    Detesto fatalismos e creio que a historia poderia ter sido diferente em função de coisas relativamente pequenas - o humor de Stalin em Yalta, as condições climaticas na semana em que os misseis soviéticos foram detectados em Cuba, o nivel etilico de Yeltsin ao dissolver a URSS na floresta de Byelovezh em 1991, etc. Por isso, acho que comitês historicos podem perfeitamente mudar o passado, desde que isso seja feito com um grau decente de realismo. Limites são essenciais, sim. Mas não devem ser vistos como camisas de força.

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